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Coiote, o Mito do Traquinas

Por intermédio de lutar com sua própria natureza coiote, o herói se vê forçado a empreender uma viagem para um plano superior e lá, ao desafiar as advertências, criar em si mesmo uma nova ordem. Depois de ter conquistado esses poderes, ainda sofre uma transformação na terra. Deve criar uma nova relação com sua esposa que, mais tarde, torna-se uma grande curandeira. Como em praticamente todos os mitos, depois que o herói ensina seu recém-adquirido conhecimento cerimonial para a família, não pode mas permanecer na terra. Deve regressar para os Seres Divinos dos quais tornou-se tão íntimo. Ele passou a ser uma espécie de salvador que sacrifica sua vida terrena para o bem de seu povo.

Coiote é a personificação do princípio dos traquinas. O ciclo dos traquinas é dos mais antigos e persistentes ciclos míticos dos nativos americanos. Os atributos mais antigos dos traquinas são sua cobiça excessiva, intensa luxúria e nomadismo. Para os Navahos não tem meta específica na vida exceto causar problemas, e, no entanto, foi ele que roubou o fogo do Deus Negro e o trouxe para o Primeiro Homem e Primeira Mulher. Foi capaz de controlar o sol e os processos vitais da criação, e rege a inauguração da sexualidade genital e do processo do parto. Roubou o filho do Mostro da Água e trouxe com isso a inundação, mas também está vinculada com a fertilidade e com um certo tipo de sabedoria prática. Contra os heróis nos mitos dos cantos, Coiote tem uma atitude abertamente hostil, mas secretamente essa posição é que mobiliza a seguir em sua própria busca espiritual. O herói encontra significado, mais Coiote tem vitalidade para atribuir substância a esse significado.

Coiote é uma das mais enigmáticas figuras da mitologia norte-americana, como traquinas, tem sua contraparte em toda cultura. Entre os Winnebagos é Wakdjunkaga, o Matreiro. Na costa noroeste, é corvo, que também está associado a criação, tem um apetite insaciável e consegue o que quer com astúcia convicente. Para os Oglalas Sioux, é Aranha, cujo pai foi rocha. No extremo oriente, é representado por sua prima, a Raposa, que causa desorganização mental, seduz os rapazes e as moças, e enfeitiça as pessoas para que percam a memória e caiam sob seu poder.

Tem sido comparado a Loki, da mitologia nórdica, a Maui da mitologia polinésia, e a Hermes entre os gregos, mas é mais rústico, erótico e francamente ambíguo que qualquer um destes. É difícil ser apreendido pelo intelecto racional, mas encanta a imaginação. Assim que sua imagem maliciosa e lasciva é captada pela percepção mais sutil, ele invade a mente. É fácil reconhecermos nele nosso próprio rosto, perscrutando na escuridão, ressentindo-se da luz, odiando o herói por seus feitos gloriosos, e ainda assim sentindo atração por ele porque ele é radioso. Coiote é o animal que, em sua dolorosa passagem pela terra multiuterina, terminou se tornando parcialmente divino.

Jung em seus comentários sobre os Mitos do Traquinas, disse: “Se, no fim e ao cabo do mito do traquinas, existe uma sugestão do salvador, essa premonição ou esperança consoladora significa que alguma calamidade aconteceu e foi conscientemente compreendida… Na história coletiva, assim com na individual, tudo depende do desenvolvimento da consciência. Isso traz uma gradual libertação do período de confinamento ao inconsciente e, portanto, é um portador da luz e da cura”. Coiote é um parceiro nessa liberação: ele força o herói a tomar consciência, um não poderia existir sem o outro. Ambos são grandes antagonistas simbólicos da mitologia mundial, opondo-se e neutralizando-se reciprocamente. Não obstante, em sua reconciliação é que reside a esperança da humanidade para ter vitalidade e completar-se.