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Dénakê e a Grande Estrela

Antigamente, os Carajás não sabiam cultivar as plantas. Viviam da caça, da pesca e da colheita. Não sabiam desbravar um terreno, nem plantar milho, mandioca ou algum fruto. Durante a estação das chuvas, acontecia-lhes, certos dias, não terem nada para comer.

Na aldeia havia duas irmãs: Imahérô, a mais velha, e Dénakê, a mais jovem. Um dia que olhavam para o Céu estrelado, em companhia do pai, que lhes contava lendas, Imahéro teve uma sensação estranha: não podia desviar o olhar da grande estrela que brilhava a sua frente. O seu coração batia com muita força e estava como que paralisada.

– O que é que brilha acolá? – perguntou ao pai. – Gostaria de tê-la.

O pai pôs-se a rir.

– É Tahina-Can, a Grande Estrela, está muito longe daqui, ninguém pode alcança-la. O único meio que tu tens para a conseguir é deseja-la vivamente. Se ela te ouvir e se ela quiser vir viver contigo, o teu desejo poderá se realizar.

Quando adormecia, a menina não pensava senão em Tahina-Can.

No decorrer da noite, ouviu alguém entrar em sua casa. Assustada, disse:

– Quem é você?

– Sou Tahina-Can – respondeu uma voz.

Louca de alegria, Imahérô precipitou-se para o clarão que apercebia na escuridão. Chamou o pai e a irmã, e acendeu um lume para ver com o que se parecia a Grande Estrela. Qual não foi sua decepção quando se deu conta que a Grande Estrela que brilhava tanto no Céu não era mais do que um velho com uma barba e cabelos brancos como o algodão. Encolerizou-se e gritou:

– Vai-te embora. Não te quero para marido. És muito velho e muito feio. Vai-te embora.

Tahina-Can voltou-se e pôs-se a chorar, muito baixinho. Dénakê correu para ele, tomou-lhes as mãos nas suas e disse-lhe:

– Aceito casar contigo. Quero que sejas meu marido.

O velhote ficou muito feliz. O casamento foi celebrado a partir do dia seguinte. Então o velhote disse à sua jovem e linda mulher:

– Agora tenho que ir para a floresta para desbravar um terreno e plantar neles um monte de coisas boas, plantas que os Carajás ainda nunca viram, mas tenho de ir só.

Foi até o rio. Disse-lhe algumas palavras mágicas, depois entrou na água até aos joelhos. Debruçou-se em frente da corrente. De tempos em tempos, mergulhava uma mão na água e tirava dela algumas sementes de milho e todas as outras plantas que hoje os Carajás cultivam. Depois se dirigiu a floresta para desbravar um terreno.

Dénakê estava inquieta por não o ver voltar. Era muito velho e muito fraco para fazer trabalhos tão duros. Devia ter-lhe acontecido alguma coisa. Talvez estivesse ferido…Não podendo esperar mais, decidiu desobedecer-lhe e ir ao seu encontro, por que a noite estava a cair. Quando chegou a clareira que o marido acabava abrir, não o avistou. A sua inquietação aumentava à medida que se aproximava. Viu então um jovem que estava a espalhar cinzas quentes pelo solo.

– Não vistes um velhote? – perguntou ela ao rapaz. – É meu marido e estou muito inquieta porque ainda não voltou à aldeia. Tenho medo que lhe tenha acontecido alguma desgraça.

– Sou Tahina-Can – respondeu o belo rapaz. – Não sou um velhote. Tomei aquela aparência para experimentar os sentimentos da jovem que tanto desejava casar comigo. A experiência foi concludente. Estou muito feliz que tu tenhas querido casar comigo, apesar da aparência que julgava ser a minha. Foi para te recompensar da tua bondade que ofereci ao teu povo todas estas culturas. Vem, voltemos à aldeia, vamos contar-lhes tudo.

Quando Tahina-Can acabou a sua história, Imahérô soltou um grito lúgubre e caiu sem sentidos. Alguns segundos mais tarde, o seu corpo volatizou-se e, em seu lugar, apareceu uma ave de rapina que, a partir desse dia, erra todas as noites, mal aparecem as estrelas, ululando tristemente.